Como o Twitter, Trump e fake news tem influenciado a bolsa de valores

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Estudos mostram como eventos na rede social podem alterar comportamento de agentes. (Foto: Divulgação)

O banco americano JP Morgan divulgou nesta quarta-feira (11) um relatório em que traz um novo índice de volatilidade. Chamado de “Volfefe”, o índice mede os impactos dos tuítes do presidente dos EUA, Donald Trump, sobre o mercado financeiro. Ele foi batizado em referência a um post feito por Trump em 2017, em que cometia um erro de digitação inusitado e escrevia a palavra “covfefe”, que viralizou.

Eventos recentes mostram que aquilo que Trump escreve em sua conta no Twitter pode ter efeitos profundos sobre o mercado de ativos financeiros. No dia 24 de agosto do último mês, por exemplo, uma sequência de postagens sobre o Federal Reserve – o Banco Central dos EUA – e a relação do país com a China levou o valor de mercado das empresas americanas a cair mais de US$ 500 bilhões. Não é apenas a conta de Trump que influencia o andamento do mercado de ativos financeiros. O comportamento dos agentes também pode ser alterado pelo clima geral da rede social e pelo impacto de notícias e boatos que circulam nela.

O brasileiro Matheus Moura Ferreira Costa pesquisou, em seu mestrado pela Fundação Getulio Vargas, defendido em julho de 2019, os efeitos que fake news propagadas por políticos têm sobre a bolsa de valores. (Foto: Twitter)

Entenda a influência do Twitter sobre a bolsa
Um estudo conduzido por seis pesquisadores da Universidade da Carolina do Norte em Charlotte, publicado em julho de 2018 pela Associação de Linguística Computacional, fez uma “análise de sentimento” em tuítes de contas verificadas, usando como parâmetro as cem ações mais mencionadas na rede social.

A amostra incluiu mais de 20 mil tuítes, todos postados nos três primeiros meses de 2017. O “julgamento” dos usuários sobre cada ação foi então comparado ao retorno diário do ativo, ou o quanto seu preço variou no dia. A pesquisa concluiu que, para a maior parte das ações analisadas, existe uma correlação estatisticamente significante entre a variação no sentimento medido do Twitter e os movimentos dos preços das ações. Isso significa que o sentimento geral do Twitter com relação às empresas ajuda a prever o movimento dos preços dos ativos na bolsa.

Quando Trump tuíta sobre empresas
Outro estudo, feito no primeiro semestre de 2017 por pesquisadores de universidades americanas, focou especificamente nos tuítes do presidente dos EUA, Donald Trump. A pesquisa analisa 27 situações em que Trump mencionou alguma empresa com ações listadas em bolsas de valores nas contas @realDonaldTrump e @POTUS.

O período compreendido começa no dia seguinte à vitória eleitoral de Trump e vai até 17 de fevereiro de 2017. O primeiro tweet que menciona uma empresa foi postado em dia 17 de novembro de 2016. O estudo também compara os impactos de tuítes escritos antes e depois da posse do presidente, que ocorreu em 20 de janeiro de 2017.

O artigo admite que a amostra não é ideal e que estudos futuros poderão fazer análises mais robustas. Após classificar os tuítes como positivos ou negativos, o estudo analisa o impacto das publicações em quatro pontos: variação diária do preço da ação, volume de transações, volatilidade e atenção dos investidores. Os resultados da pesquisa mostram que, com exceção da volatilidade do preço, todas as variáveis sofreram alterações estatisticamente significantes após os tuítes de Trump. Curiosamente, o efeito era mais acentuado antes da posse.

O estudo também concluiu que tuítes “originais”, ou seja, aqueles que não eram respostas do presidente a notícias ou acontecimentos, tiveram impacto maior. Sobre o uso do Twitter para anúncio de políticas e medidas governamentais, os pesquisadores destacam que os tuítes do presidente americano costumam trazer informações surpreendentes, que pegam o mercado desprevenido – o que, por sua vez, pode levar tanto a ganhos como a perdas de milhares de dólares.

As reações às fake news de Obama e Trump
O brasileiro Matheus Moura Ferreira Costa pesquisou, em seu mestrado pela Fundação Getulio Vargas, defendido em julho de 2019, os efeitos que fake news propagadas por políticos têm sobre a bolsa de valores. Costa comparou os impactos de informações falsas ditas em diferentes canais de comunicação por dois presidentes americanos: Barack Obama e Donald Trump.

Foram analisadas 180 declarações ao todo, sendo 60 verdadeiras e 120 falsas. Elas foram ditas em debates, discursos, entrevistas e também no Twitter. O estudo conclui que, quando considerado o total da amostra, as notícias falsas levam a retornos anormais no mercado de ações, na ordem de cerca de 1,8%.

Os números da pesquisa mostram também que as reações costumam ser mais fortes no caso de fake news de teor negativo. A investigação específica para cada um dos presidentes, entretanto, revela diferenças sobre as reações do mercado às notícias falsas.

Com Obama, mesmo quando a argumentação era falsa, a bolsa de valores reagia positivamente a comentários favoráveis sobre uma empresa, e negativamente a comentários desfavoráveis.

No caso de Trump, ocorre um efeito diferente. O estudo mostra que o retorno das ações cai quando o atual presidente americano faz comentários positivos sobre uma empresa com base em informações falsas. O efeito é pior do que quando o presidente faz declarações com teor negativo embasadas em falsidades. Isso pode indicar que o mercado não confia em Trump e que o presidente está com baixa credibilidade entre os agentes da bolsa de valores.

Os bots que lêem o Twitter
Cientes da importância do Twitter na volatilidade do mercado, agentes passaram a observar os robôs (ou bots) que acompanham as redes sociais e detectam as principais movimentações e sentimentos relacionados à bolsa de valores.

A Bloomberg, por exemplo, já desenvolveu tecnologias de monitoramento do Twitter, avisando seus clientes quando muitas pessoas estão falando sobre determinado assunto. Além disso, há plataformas que se propõem a detectar o sentimento do Twitter sobre as empresas do mercado financeiro, fazendo leituras robotizadas da rede social.