Ingestão de alimentos alcalinos não combate o novo coronavírus

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Circula por todas as redes sociais a informação de que o pH do novo coronavírus varia entre 5,5 e 8,5, e que ingerir alimentos com pH superior a esse valor, como alimentos alcalinos, é o suficiente para combater o vírus.

A mensagem diz que uma revista de virologia publicou, em abril de 1991, uma pesquisa que mostrava que alimentos como limão, laranja, tangerina, manga, alho e abacaxi são eficazes contra o coronavírus. “Tudo o que precisamos fazer para vencer o vírus corona: precisamos ingerir mais alimentos alcalinos, que estão acima do nível de pH do vírus”, diz a mensagem.

Porém, a informação é falsa. O pH é uma escala de 0 a 14 que mede a concentração de íons de hidrogênio, e serve para medir o grau de acidez, neutralidade ou alcalinidade de uma solução ou substância.

O virologista Rômulo Nery, da UFRJ, atualmente pesquisador visitante da Universidade da Califórnia, desmentiu a informação compartilhada a respeito do tal “pH do novo vírus” ao G1.

“Esse pH de 5,5 não é próprio do vírus, mas é o que ele precisa encontrar no ambiente celular para se propagar. E isso não pode ser mudado pela alimentação, ao contrário do que consultores dizem (ao tratar de dietas)”, explica.

“Não é possível mudar o pH da sua garganta ou do seu pulmão (onde chega o vírus) pelo fato de a alimentação ser mais ácida ou mais básica. Os alimentos são processados no estômago, que tem pH muito ácido. Quando os nutrientes são absorvidos pelo sangue, o pH não é mais relevante”, aponta. “O vírus não está só na garganta, mas no pulmão, traqueia, brônquios, onde comida e bebida não chegam.”

Um organismo humano saudável tem pH sanguíneo nem ácido demais nem muito alcalino – a marca varia entre 7,35 e 7,45. Na mensagem falsa, são listados alimentos que podem, pelo pH alto, deter o novo vírus. Mas há inconsistências no próprio texto: o abacate, por exemplo, é listado como tendo pH 15,6, sendo que a escala termina em 14.

Sobre o artigo de 1991 publicado no “Journal of Virology”, da Sociedade Americana de Microbiologia trata de um outro vírus, não o COVID-19 que é novo. O coronavírus em questão era o MHV4. Além disso, o artigo da revista não dizia que o MHV4 tinha um certo nível ou intervalo de pH. Na verdade, o objetivo do estudo era ver o que acontecia quando células de camundongos ou ratos eram infectadas com o vírus. Ou seja, também não há nenhuma lista de alimentos no artigo.

O vírus que causa a pandemia atual tem a sigla SARS-CoV-2. O novo coronavírus não tinha sido identificado em 1991 – ele só foi descoberto em dezembro do ano passado, após os primeiros casos, na China. De lá para cá, são mais de 742 mil casos no mundo todo, com cerca de 35,3 mil mortes.

Conteúdo de fact-checking do Pipeify.